Vivemos em uma era em que tempo é sinônimo de dinheiro — mas, cada vez mais, o tempo não é apenas medido em produtividade, e sim em permanência. O que vale ouro hoje é o nosso olhar fixo na tela, o clique no próximo vídeo, o scroll infinito no feed. É por isso que plataformas como TikTok, YouTube, Netflix, Instagram e tantas outras não foram feitas apenas para entreter, mas para capturar atenção — e mantê-la. O fenômeno do “só mais um episódio” ou “só mais um vídeo curto” não é casual: é projetado.
Por trás de cada notificação, de cada sugestão de conteúdo e de cada autoplay, há um sistema robusto que utiliza inteligência artificial, análise de comportamento e testes constantes para maximizar o engajamento. A isso se chama economia da atenção — uma engrenagem que transforma minutos despercebidos em bilhões de dólares. Mas o que isso custa para quem assiste? Saiba aqui, no O Contábil.
O design do vício e a arquitetura da distração

As plataformas que dominam o entretenimento digital hoje são construídas para prender o usuário pelo máximo de tempo possível. Isso envolve o uso de algoritmos que aprendem com os padrões de consumo e, rapidamente, ajustam a entrega de conteúdo para manter a pessoa envolvida. A Netflix, por exemplo, eliminou os créditos finais e inseriu a função de reprodução automática entre episódios. Já o TikTok apresenta uma sequência infinita de vídeos curtos altamente personalizados, gerando picos constantes de dopamina.
Esse tipo de design é conhecido como “arquitetura da distração”, conceito discutido por estudiosos como Tristan Harris, ex-designer do Google e fundador do Center for Humane Technology. Segundo Harris, os sistemas digitais não apenas competem pela nossa atenção, mas moldam nossos comportamentos e percepções de tempo. A consequência direta é que perdemos a capacidade de desconectar e de escolher o ócio consciente.
Custo financeiro disfarçado de lazer gratuito
É comum associarmos o consumo de conteúdo nessas plataformas a uma atividade “gratuita”. Mas, na prática, esse consumo tem um custo oculto. O tempo gasto com maratonas de séries ou vídeos curtos pode ser tempo subtraído de tarefas remuneradas, da busca por oportunidades profissionais ou até mesmo do planejamento financeiro. Além disso, o modelo freemium dessas plataformas muitas vezes conduz a gastos impulsivos, como assinaturas premium, compras in-app e consumo por conveniência.
Não se trata apenas de dinheiro perdido diretamente. Há também o estímulo ao consumo passivo. Ao assistir vídeos sobre produtos ou estilos de vida, o usuário é influenciado por publicidade disfarçada de conteúdo orgânico. É a atenção convertida em desejo — e, em seguida, em transação. Como mostra o DataReportal, os gastos em publicidade digital ultrapassaram US$ 600 bilhões globalmente em 2023, refletindo exatamente essa monetização da atenção (fonte: DataReportal).
Impactos sobre a saúde mental e a produtividade
A economia da atenção também cobra um preço alto em termos de saúde mental. A exposição contínua a estímulos visuais e sonoros interfere no sono, na concentração e na regulação emocional. É comum que usuários passem horas assistindo vídeos à noite, prejudicando a qualidade do descanso e acordando com sensação de cansaço. Além disso, o excesso de informação fragmentada pode afetar a memória de longo prazo e a capacidade de foco.
Em um estudo da American Psychological Association, foi identificado que o uso constante de mídias digitais está associado a maiores níveis de ansiedade, depressão e estresse. Ainda que o entretenimento possa parecer uma válvula de escape, ele também atua como gatilho emocional, especialmente quando apresenta padrões de vida inatingíveis, comparações sociais e estímulos negativos mascarados de humor.
O tempo como recurso escasso e monetizável

A principal armadilha da economia da atenção é nos fazer esquecer que o tempo é limitado. Em um sistema onde tudo é “sob demanda”, desenvolvemos a ilusão de que sempre haverá um momento depois para fazer o que realmente importa. Mas quando esse momento chega, estamos cansados, distraídos ou simplesmente já investimos nosso tempo em outro episódio, outro vídeo, outro clique.
Essa lógica cria uma economia baseada no desvio constante do foco. A produtividade pessoal se reduz, o planejamento de médio e longo prazo se compromete e o custo de oportunidade se torna imenso. Quanto tempo é perdido ao longo de um ano com “só mais um episódio”? E quanto esse tempo poderia render se fosse investido em descanso, aprendizado ou planejamento financeiro?
Considerações finais
A economia da atenção nos convida a um consumo contínuo e aparentemente inofensivo, mas que, na prática, tem implicações profundas sobre nossas rotinas, finanças e bem-estar. Ao entender como funcionam os mecanismos que nos mantêm conectados, ganhamos a chance de reconquistar o controle sobre nosso tempo. O desafio é resistir à lógica do imediatismo e construir hábitos mais conscientes — porque no fim das contas, cada episódio a mais pode significar uma escolha a menos sobre onde realmente queremos estar.